quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

As Crônicas narradas através das Cartas de Ponta Grossa - 3ª carta em Mossoró

Mossoró, 28 de junho de 2009.
 
Amigos (as):
PAX!
 
         A experiência de fundar um Mosteiro Beneditino tem sido pra mim de uma riqueza indescritível! Tenho tentado passar pra vocês, através dessas Cartas aos domingos, um pouco de tudo que eu tenho vivido, mas tenho  consciência de que nem de longe as palavras  são capazes de traduzir tudo o que eu sinto.
         Algumas coisas a gente pode verbalizar. Outras não. É impossível, já que se situam na esfera espiritual. Partilho, então, com vocês aquilo que eu consigo expresssar.  Pouco a pouco Deus foi me mostrando que quem conduz o processo não sou eu, mas Ele. Quantas e quantas vezes eu pensei estar percorrendo o caminho certo e, lá pras tantas, Ele me aponta um caminho totalmente diferente. No início eu ficava atônito, perplexo, porque eu acreditava piamente que aquilo era exatamente o que eu deveria fazer. Eu estava tão seguro! Pra mim, às vezes, era tão claro que parecia impossível estar equivocado. E como eu me enganei!.. Por exemplo, eu estava convencido que o meu Noviciado seria na França: os Abades D. Jacques e D. Joel me haviam convidado e estava tudo encaminhado neste sentido. Pra mim não seria nenhum sacrifício retornar à França, que é um país que eu amo tanto. Não deu certo. Aí pensei em vários lugares: Olinda, Messejana, Garanhuns, Salvador, Rio de Janeiro... Não foi nenhum desses Mosteiros que Deus reservou para mim, mas um que nem estava na minha lista: Ponta Grossa, PR.
         Outra coisa que aprendi foi que todas as mudanças que houve foram sempre, indiscutivelmente, para melhor. Então fui me acostumando e, longe de me frustrar, elas começaram a ser encaradas como necessárias e, portanto, bem vindas. Por exemplo: eu saí de Mossoró com o propósito de, após terminar o Noviciado, voltar à nossa cidade e iniciar uma experiência diocesana. Mas, lá em Ponta Grossa o Abade achou melhor assumir a Fundação, que eu imaginava ser a melhor opção. Porém depois Deus interferiu mais uma vez apontando uma outra alternativa... certamente a melhor. A experiência que a Trindade quer de nós parece ir na direção de uma maior liberdade, o que é ao mesmo tempo muito bom e extremamente desafiador, uma vez que a responsabilidade é infinita e espantosamente maior.
         Outra coisa que eu aprendi muito foi com relação ao tempo. Antes eu era muito apressado, queria ver logo resultados, chegando até a definir data de Fundação, número dos monges fundadores, etc... A Trindade me fez ver que esse “departamento” não me dizia respeito. Como eu me enganei ao interpretar como um “sinal” de Deus a coincidência da Festa da Santíssima Trindade acontecer no mesmo dia em que eu completei 28 anos de Padre: 7 de junho. Pra mim era tão claro que o Mosteiro tinha que ser fundado nesta data! Ainda não era dessa vez.
         Mas talvez a experiência mais rica seja a da Cruz. Vocês sabem que, no início, tudo estava acontecendo sem nenhum problema, tudo fácil demais, o que me levou a desconfiar se o Projeto era mesmo de origem divina. Na dúvida começamos a pedir a Deus que nos mandasse Cruz como prova de que era mesmo vontade dEle. Aí Ele nos atendeu prodiga e generosamente. E nunca mais faltou sofrimento: injustiças, agressões, humilhações, calúnias, etc... Justamente vindas de quem menos esperávamos. Algumas pessoas não entendem a minha reação diante de tudo isso e querem que eu responda com a mesma “moeda”... Mas como fazer isso se é exatamente a Cruz que me dá a segurança de estar no caminho certo? Não conheço nenhuma história de Fundação que não tenha Cruz... Como descer ao nível de quem me agride se pra mim toda agressão é sinal de insegurança e fraqueza e eu me sinto cada dia mais seguro e mais forte?!. Como odiar quem me humilha se é exatamente nessas circunstâncias que eu me aproximo cada vez mais do Cristo sofredor e humilhado? Somente uma coisa me angustia: sei que a humildade é uma virtude e acho que Deus me deu esta graça (portanto nenhum mérito meu), mas a humilhação é um pecado e, portanto, tenho evitado ser causa de pecado para alguns irmãos me afastando temporariamente deles. Como estranhar isso tudo se, de uma certa forma, tudo isso era esperado e até desejado por nós?
         Antes também eu desejava iniciar de uma forma diferente: com um bom número de candidatos e já num edifício definitivo e bem grande. Mas lá em Ponta Grossa nosso santo ancião D. Geraldo me advertia: “Comece pequenininho, Padre. Comece pobre”. Hoje percebo que ele tinha razão. Ele que tinha tanta vontade de participar conosco desta Fundação!..  Ele que sonhou tanto conosco!.. Hoje me vejo na obrigação de fazer uma seleção rigorosa no processo de escolha, porque o que importa no momento é a qualidade e não a quantidade. E tenho recebido apelos dramáticos de alguns interessados pedindo que eu os aceite “por tudo quanto há de mais sagrado!” Mas é justamente em nome dessa “sacralidade” que eu não posso aceitar todo mundo. Só peço a Deus duas coisas: que eu não cometa nenhuma injustiça e que eu não comprometa o projeto.
         O resto, meus amigos, é pura alegria! Satisfação, prazer, contentamento... ao lado de muita paciência, humildade, reconhecimento da nossa insignificância e pequenez! Peço que continuem rezando por nós, para que sejamos fiéis e perseverantes até o fim.
         A Trindade Santa nos ilumine, a prudência da Virgem Maria nos inspire e a sabedoria humana de Nosso Pai S. Bento nos esimule.
         Grande abraço do
Ir. Manoel

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