terça-feira, 29 de novembro de 2011

Sexta e a vida breve

Ao meio-dia, reunimo-nos para o Ofício de Sexta. Sexta também pode ser chamada de Hora Média ou Meridiana porque marca a divisão do dia em duas partes (manhã e tarde). Relembramos nesse momento a hora em que o Cristo foi levantado da terra e abrindo os braços traçou o sinal de nossa redenção. Por isso, geralmente os salmos rezados retratam a brevidade da vida, lembrando-nos assim que a qualquer momento deveremos prestar contas a Deus a respeito do que fizemos em nossa peregrinação nessa terra.

domingo, 27 de novembro de 2011

Apoftgemas

De um certo Abade Apolo da Cétia, diziam que fora pastor nos campos. Certa vez no campo viu uma mulher grávida, e, movido pelo demônio, disse: “Quero ver como o embrião está colocado no ventre desta mulher”. E, tendo-o aberto, viu o embrião. Logo, porém, repreendeu-o o seu coração; compungido, foi para a Cétia, onde confessou aos Pais o que fizera. Ouviu-os então a salmodiar: “Os dias de nossos anos ordinariamente perfazem setenta anos; nos poderosos, porém, oitenta: e o que os ultrapassa é trabalho e fadiga”. Disse, pois: “Tenho quarenta anos de idade, e ainda não fiz uma oração; se, porém, viver outros quarenta anos, não cessarei de orar a Deus para que me perdoe os meus pecados”. Nem trabalho manual fazia ele, mas rezava sempre nestes termos: “Pequei como homem que sou, sê tu propício como Deus”. Esta prece se lhe tornou um exercício constante, de dia e de noite. Um irmão, que morava com ele, ouviu-o dizer: “Atormentei-te, ó Senhor, perdoa-me, para que descanse um pouco”. Por fim conseguiu a plena segurança de que Deus perdoara todos os seus pecados, mesmo o pecado cometido contra a mulher; quanto à criança, porém, não obteve certeza nenhuma. Disse-lhe, então, um dos anciãos: “Deus te perdoou também o pecado cometido com a criança; Ele, porém, deixa-te na tribulação, porque convém à tua alma”. (Apolo, 2)

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

As Crônicas narradas através das Cartas de Ponta Grossa - 1ª carta

Prosseguindo com a história da fundação de nossa Casa, publicaremos algumas Cartas escritas por nosso Superior. Afinal, ninguém melhor do que ele para contar como recebemos a Tradição Monástica

Ponta Grossa, 20 de abril de 2008
 
Caros Amigos:
PAX!
 
         Desde que decidimos fundar um Mosteiro Beneditino em Mossoró sabíamos que seria necessário receber a Tradição Monástica de um outro Mosteiro já constituído. “Ninguém se faz monge sozinho. Alguém o gera”, diz o Abade D. André. Neste campo não existe autodidatismo. Se não se recebe, não se pode transmitir. Por isso que, desde 2001, vínhamos sondando, com este objetivo, através de contatos telefônicos ou por e-mails, os diversos Mosteiros existentes no Brasil. No entanto, sem maiores compromissos, uma vez que outros passos deveriam ser dados no âmbito da Diocese, com o apoio do Bispo.
         Em janeiro de 2006 conhecemos em Natal dois Abades franceses: D. Jacques (de Belloc) e D. Joel (de Tournay) que me convidaram para fazer o meu Noviciado numa dessas Abadias e depois, na minha volta, ajudar a articular as demais Fundações Diocesanas que existem no Nordeste, no sentido de uma futura agregação à Congregação Beneditina Sublacense. Pensei em aceitar o convite mas, Pe. Sátiro, que desde o início foi um grande incentivador deste Projeto, me convenceu a permanecer no Brasil. Hoje reconheço que ele estava coberto de razão.
         Com a minha decisão de ficar por aqui mesmo os Abades franceses me sugeriram, então, que tentasse o Mosteiro de Olinda. Foi o que eu fiz. Já conhecia o Abade D. Bernardo que me comunicou que, infelizmente, não poderia tomar nenhuma decisão já que estava renunciando ao cargo por problemas de saúde. Esperei, então, a Bênção Abacial do seu substituto, D. Felipe, que me disse, ao ser contatado, que iria transferir o noviciado de Olinda para Salvador. Falei, então, com D. Beda, do Mosteiro de Messejana, que também me comunicou que estava enviando seus noviços para Salvador. Foi quando entrei em contato com D. José Gabriel, Prior do Mosteiro de Garanhuns. Ele também estava renunciando ao Priorado e quando chegou o novo Prior, D. Gregório, falei com ele que me disse que estava com problemas de formadores e não poderia nos receber.
         Aí entrei em contato com o Arquiabade Presidente da Congregação Beneditina do Brasil, D. Emanuel d’Able do Amaral, da Arquiabadia de Salvador, que me sugeriu a Abadia da Ressurreição, em Ponta Grossa, PR. Entramos em contato com o Abade D. André Martins que, após consultar o Capítulo, me telefonou dizendo que eles estavam com as portas e os corações abertos para nos receber e que já poderíamos ir na Quaresma. Disse mais: que eles estavam realmente interessados em investir na Fundação de um Mosteiro no Nordeste, já que estavam recebendo muitas vocações da nossa Região e a lista de espera estava crescendo.
         Logo D. Mariano escreveu uma carta para ele me apresentando, dizendo que estava de acordo com a Fundação do Mosteiro da Santíssima Trindade em Mossoró e autorizando o Abade a fazer a nossa vestição.
         Além de mim também iriam o Ir. André de Soveral e o Ir. Lucas. O primeiro viajou antes para S. Paulo, onde ficou alguns dias na casa de uns parentes e o segundo viajou de Recife. O meu vôo saiu de Fortaleza, fez conexão em S. Paulo e no Aeroporto de Cumbica nos encontramos e seguimos os três juntos para Curitiba.  No Aeroporto da capital paranaense estavam nos esperando o próprio Abade D. André Martins e o Prior D. Rafael. De lá seguimos para Ponta Grossa, onde chegamos por volta das 09:30h do dia 14 de abril de 2007.
         Foi uma chegada festiva na Abadia da Ressurreição. Os sinos anunciavam a nossa chegada e toda a Comunidade veio ao nosso encontro para nos abraçar, desejar boas vindas,  sob o olhar sorridente e feliz do nosso Abade. De fato, S. Bento no número 53 da sua Regra diz que “todos os hóspedes que chegarem ao Mosteiro, sejam recebidos como o Cristo, pois Ele próprio irá dizer: ‘Fui hóspede e me recebestes’ (Mt. 25,35)”. Pois fomos acolhidos aqui no melhor estilo beneditino.
         Leonardo Boff escreveu 3 livros apresentando as virtudes básicas para um outro mundo possível, na perspectiva de uma ética mundial  que favoreça a vida do ser humano na terra, nossa casa comum. São elas: a hospitalidade, a convivência, o respeito, a tolerância e a comensalidade. No volume 1 ele fala da Hospitalidade como Direito e Dever de todos. No Capítulo III  ele narra o mito da Hospitalidade que transcrevo:
         “Júpiter, o deus criador e seu filho Hermes, quiseram saber como andava o espírito de hospitalidade entre os humanos. Travestiram-se de pobres e começaram a peregrinar pelo mundo afora.. Foram maltratados por uns, expulsos por outros.
         Depois de muito peregrinar tiveram que cruzar por uma terra cujos habitantes eram conhecidos por sua rudeza.. As divindades sequer pensavam em pedir hospitalidade. Mas à noitinha passaram por uma choupana onde morava um casal de velhinhos, Báucis e Filêmon. Qual não foi a surpresa, quando Filêmon saiu à porta e sorridente foi logo dizendo: Forasteiros, vocês devem estar exaustos e com fome. Entrem. A  casa é pobre mas aberta para acolhê-los.
Báucis ofereceu-lhes logo um assento enquanto Filêmon acendeu o fogo. Báucis esquentou água e começou a lavar os pés dos andarilhos. Com os legumes e um pouco de toucinho fizeram uma sopa suculenta. Por fim, ofereceram a própria cama para que os forasteiros pudessem descansar.
Nisso sobreveio grande tempestade. As águas subiram rapidamente e ameaçavam a região. Quando Báucis e Filêmon quiseram socorrer os vizinhos, ocorreu uma grande transformação: a tempestade parou e, de repente, a pequena choupana foi transformada num luzidio templo dourado. Báucis e Filêmon ficaram estarrecidos. Júpiter foi logo dizendo: Por causa da hospitalidade quero atender um pedido que fizerem. Báucis e Filêmon disseram unissonamente: O nosso desejo é servir-vos nesse templo por toda a vida. Hermes não ficou atrás: Quero que façam também um pedido. E eles, como se tivessem combinado, responderam: Depois de tanto amor gostaríamos de morrer juntos.
Seus pedidos foram atendidos. Um dia, quando estavam sentados no átrio, de repente Filêmon viu que o corpo de Báucis se revestia de folhagens floridas e que o seu próprio corpo também se cobria de folhas verdes. Mal puderam dizer adeus um ao outro. Filêmon foi transformado num enorme carvalho e Báucis numa frondosa  tília. As copas e os galhos se entrelaçaram no alto. E assim, abraçados, ficaram unidos para sempre. Os velhos até hoje repetem a lição: quem hospeda forasteiros, hospeda a Deus.
A Comunidade da Abadia da Ressurreição de Ponta Grossa tem sido para nós como o casal Filêmon e Baucis. Aqui viemos fazer uma experiência de 2 anos, mais ou menos, que corresponde, na linguagem da formação monástica, ao Noviciado. E o que é experiência? Vamos dissecar esta palavra apelando para a etimologia:
Ex = é uma preposição latina que significa estar orientado para fora, exposto a, aberto para. Por exemplo: ex-clamação; ex-posição; ex-istência. Manifesta uma característica fundamental do Homem que é, justamente, ser voltado para fora, em diálogo e em comunhão com o outro ou o mundo.
Peri = diz respeito a todos os lados. Daí “periferia”.
Ência = nos remete ao conhecimento. Por exemplo: “Ciência”.
Então, numa interpretação livre, a experiência seria o conhecimento que o Homem adquire quando sai de si e estuda o mundo por todos os lados. Não viemos em busca de conhecimento teórico ou livresco. Para isto não haveria necessidade de sair de Mossoró. Mas viemos em busca de viver a realidade de um Mosteiro nas suas  múltiplas dimensões: liturgia, trabalho, administração, tradição monástica, espiritualidade, formação, etc. Naquela concepção de Aristóteles que diz: “A experiência não resulta de uma percepção isolada, mas constitui uma síntese de muitas percepções e combinações reunidas, naquilo que possuem de comum, dentro de um modelo esquemático”.
Que Deus Uno e Trino, a Santíssima Virgem Maria e nosso Pai S. Bento derramem sobre todos vocês copiosas bênçãos.
 
Grande abraço.
 
Ir. Manoel, OSB

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Apoftgemas

O Abade João o eunuco, quando era jovem, perguntou a um ancião: “Como pudeste vós outros realizar a obra de Deus em paz? Nós nem com fadiga conseguimos realizar”. Respondeu o ancião: “Nós o pudemos, porque estimamos a obra de Deus como o principal e as necessidades do corpo como o mínimo. Vós, porém, tendes as necessidades do corpo como o principal, e a obra de Deus como menos necessária. Por isto é que vos fatigais, por isso também é que o Salvador disse a seus discípulos: “Homens de pouca fé, procurai primeiramente o reino de Deus, e todas estas coisas vos serão dadas em acréscimo”. (João o Eunuco, 1)

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Tércia: revivendo Pentecostes

Às 9 horas, fazemos a primeira pausa em nosso dia para rezarmos o Ofício de Tércia ou Terça. Esse momento nos relembra o dom do Espírito Santo que desceu sobre os Apóstolos e os ensinou a falar em todas as línguas para levar o nome de Cristo até os confins da terra. Em nossa rotina, esse Ofício tem um sabor especial, pois meditamos sempre um trecho do salmo 118 que é uma meditação sobre a Palavra de Deus; e sendo este o momento em que o Espírito Santo abriu as mentes dos primeiros anunciadores do Reino, pedimos que ele abra nossa mente para compreendermos sempre mais as maravilhas da Palavra de Deus. Tércia é a primeira das três Horas Menores, assim chamadas porque estes Ofícios são sensivelmente mais breves que as Horas Maiores.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Nossa Senhora rega a ‘planta’

Durante o segundo semestre de 2006, nosso fundador esteve angustiado. Afinal, sem saber onde beber da tradição e com as pessoas pedindo uma resposta, só nos restava nos recomendarmos às orações das pessoas. E como diz Jesus: “Pedi e recebereis”. Padre Guimarães recebeu então uma revista onde havia uma reportagem sobre Nossa Senhora. Foi nesse momento que se percebeu a ausência dela no projeto; justamente a Consoladora dos aflitos, Advogada nossa e Mãe da Divina Graça, Jesus Cristo. Isso ocorreu em uma sexta-feira, quando nosso fundador acendeu uma vela, rezou um terço e confiantemente pedia que ela indicasse o caminho a seguir. Na segunda-feira, tudo clareou. A Abadia da Ressurreição, em Ponta Grossa (PR) que não estava nos planos. O pedido foi feito ao Abade do mosteiro e após o tempo necessário, ele respondeu que o receberia “de portas e corações abertos”. A partir desse momento, nada mais se faz sem a Mãe do Bom Conselho que no momento mais crucial do projeto não nos desamparou.

domingo, 13 de novembro de 2011

Apoftgemas

O Abade Abraão dizia de um dos habitantes da Cétia que era perito em escrever e não comia pão. Certa vez um irmão foi pedir a esse que lhe escrevesse algo sobre uma tabuinha. Ora o ancião, tendo a mente ocupada em contemplação, escreveu omitindo versos e não observando alinhamento. O irmão então tomou o escrito e quis retocar o alinhamento; nisto porém, notou que faltavam frases. Disse, pois, ao ancião: “Vai, cumpre primeiro o que está escrito; depois volta, e te escreverei o resto”. (Apoftegma 3)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

As Laudes e o Sol nascente

Às 6h, rezamos o Ofício de Laudes. Laudes vem do latim 'laudare' que significa louvar; esse nome surgiu porque ao iniciar o dia sempre eram rezados os salmos 148, 149 e 150 que iniciam com o verbo louvar. O Ofício de Laudes é rezado ao iniciar o dia, ou seja, quando o Sol nasce. Porque o Cristo Senhor ressuscitou ao nascer do dia, transformando-se assim no verdadeiro Sol da Justiça que 'ilumina todo homem, extirpando as trevas' (como diz um hino que cantamos). Laudes é um dos ofícios mais importantes do dia, pois com ela consagramos todo o nosso dia a Deus; os leigos também são convidados a rezarem esse ofício, pois consagrar o dia a Deus é um dever do cristão que deseja ser considerado digno desse nome,

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Nosso Ofício Divino

Algumas pessoas ao conhecerem nosso ritmo de vida, assustam-se com nossos horários. Por isso, nos próximos dias iremos postar a importância de rezarmos cada Ofício em uma determinada hora do dia.
Nosso dia inicia com o Ofício de Vigílias às 4h20min. Rezamos ainda de madrugada, pois o ato de vigiar requer sacrifícios. O que nos inspira é a palavra de Cristo no Evangelho de Lucas (21, 36): "Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do homem". Sabemos que Nosso Senhor um dia irá voltar, mas não sabemos quando. A esse respeito, Ele contou várias parábolas e uma das mais interessantes e que acontece muito hoje fala sobre o dono da casa, que se soubesse quando o ladrão chegaria não seria assaltado, pois não se surpreenderia. O Cristo voltará como um ladrão, ou seja, silenciosa e repentinamente... Quando rezamos vigílias nos lembramos desses fatos e esperamos estar vigilantes quando Jesus voltar para consumar a história.